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a world in a grain of sand

um mundo num grão de areia

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um mundo num grão de areia

Muda de Vida

Sofia
15
Ago23

Passou meio ano desde a última vez em que aqui estive a escrever. Podia dizer que passou rápido, mas a intensidade faz-me viver todos os momentos de forma não tão fugaz.

Sinto-me feliz e a recuperar a minha vida. Tinha-me inscrito no ginásio, mas falhei muitas das idas, apesar de fazer exercício em casa. À medida que o tempo passa, as coisas mudam. Também eu mudei e criei novos hábitos que antes pareciam não resultar.

Voltei a ir a concertos. Este mês também fomos ao teatro (ver O Diário de Anne Frank - recomendo). Não ia ao teatro há anos e senti-me imensamente feliz, sobretudo por estar a voltar ao Teatro Maria Matos, o teatro da minha infância. Foram imensas recordações de momentos de magia. Lembrei-me das imensas peças do TIL que tinha visto em criança e o meu coração encheu-se de alegria. Enquanto recordava, o David perguntava-me "Ainda te lembras disso tudo?". Lembro-me e espero continuar a lembrar-me sempre se a vida mo permitir. Porque as memórias felizes merecem ser parte do nosso jardim, embelezar os nossos dias e fazer-nos florir.

No mês passado fui ao médico. Descobri que o meu médico de família se reformou e que fiquei sem médico de família. Faço agora parte das estatísticas negativas. Ainda assim, consegui ir a uma consulta. As minhas enxaquecas teimavam em não desaparecer. Não sou médica, mas conheço o meu corpo e sentia que não era apenas stress. A consulta com uma médica diferente deu-me esperança. Talvez fosse a pílula que tomava. As enxaquecas intensas, às vezes com náuseas e vómitos, aconteciam sempre na semana em que fazia a pausa da pílula. Nunca tinha tido problemas, mas o corpo também muda. Estou agora num novo período de mudança e, se tudo correr bem, as enxaquecas ficarão para trás e poderei voltar a levar a minha vida sem aquele latejar horrível. Faz hoje um mês que troquei de pílula e parece-me que estou no bom caminho.

A consulta foi mais marcante do que pensava. Saí de lá com esperança de ultrapassar algo que me atormentava desde que tive Covid e com enorme vontade de recuperar a minha vida e os hábitos saudáveis. Preciso de perder peso e, apesar de o saber, não estava a conseguir comprometer-me comigo mesma. Depois da consulta, cheia de esperança de que tudo ia mudar, levei-me mais a sério e as coisas começaram a mudar. Não tenho ido ao ginásio, mas quase todos os dias faço exercícios em casa. Instalei uma app chamada FitOn e já não tenho desculpas de me faltar tempo. Nos dias mais atarefados, retiro pelo menos 10 minutos para mim, sem culpas por não ir ao ginásio ou não fazer algo mais intenso. Os dias não são todos iguais e o mais importante é manter-me consistente. Isto é o amor-próprio. Com foco em mexer-me mais e em ter mais cuidado com a alimentação, já consegui perder 6kg. No passado, já tinha perdido muito peso, mas depois de ter ganho tanto peso quando ficámos fechados em casa, parecia-me difícil voltar a ser capaz, especialmente quando me ia abaixo devido às enxaquecas.

São pequenas conquistas que nos fazem chegar longe. Hoje volto a escrever para mais tarde me recordar e para dizer que estou bem. Estou a cuidar de mim e a tentar viver com intensidade e todas as minhas forças.

 

Humanos - Muda de Vida

O velho e o novo e o Tejo a passar ao lado

Sofia
22
Mai22

Bem sei que deixei de cá vir. Primeiro, faltava-me tempo. Depois, ganhei tempo, mas esse tempo tem sido usado para cuidar de mim.

Mudei de trabalho há 2 meses e, apesar de ter voltado ao trabalho presencial, ganhei muito mais tempo para mim. De facto, foi um dos motivos que me levou a arriscar e a aceitar uma nova aventura. Não é fácil tomar certas decisões, mas essas são aquelas decisões que vão definir a nossa vida. São decisões que calcam fundo no caminho que percorremos e que se transformam em marcos na passagem dos anos. Tem sido fantástico voltar a trabalhar presencialmente e nunca pensei desafiar-me ao ponto de estar num trabalho em que também lidasse com clientes presencialmente. Claro que tenho medo de ter arriscado e de, no fim, não ser este o meu lugar, mas é preciso avançarmos e não deixarmos que o medo nos paralise. Neste momento, sinto-me bem onde estou e é aqui que quero estar. A nível pessoal, a mudança de emprego fez-me voltar a ter mais tempo. Por muito que gostasse da minha antiga empresa, colegas e chefias, as horas de trabalho e o ritmo alucinante não me estavam a fazer bem. Agora, não tenho sentido tantas dores de cabeça como antigamente e, à noite, durmo muito melhor. Podia ter optado por tomar os ansiolíticos que o médico me passou, mas continuo uma teimosa e achei que seria melhor procurar um caminho diferente e que resolvesse as questões a fundo. A oportunidade apareceu-me numa altura em que eu precisava de mudar e, quando algo nos aparece sem procurarmos, deve ser um sinal de que afinal há algo mais para nós.

Talvez agora possa voltar a escrever mais no blog e fora dele. Estou a agarrar as rédeas da minha vida e a reencontrar-me e não podia estar mais feliz. Ontem celebrei 12 anos de namoro. No meio das mudanças, mantêm-se as melhores coisas. Passeámos pela nossa Lisboa como antigamente e fomos jantar aonde já tínhamos jantado noutros tempos. O tempo passa e há espaços que se mantêm nas nossas cabeças e nas cidades. Visitar Lisboa é agora mais agradável. A nossa vida profissional já não passa por Lisboa. No meu novo percurso do trabalho para casa passo pelos sítios da minha infância: a minha antiga praceta, as escolas onde estudei, o pequeno shopping local que me parecia enorme quando eu era uma criança, o meu antigo ginásio aonde penso agora regressar... Todo este novo percurso faz sentido. O velho e o novo juntos trazem-me o equilíbrio que eu tanto procurava recuperar.

Sejam felizes :)

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Lisboa, 21 de Maio de 2022

Um poema para cada mês - Março 2021

Sofia
03
Jan21

Março é para mim um mês especial por ser o mês do meu aniversário. Por esta razão, a escolha que trago é uma escolha de celebração e ainda mais pessoal que as anteriores. Para mim, descobrir o poema "Song of Myself" foi reconhecer um sentimento que já existia em mim mas que ainda não se tinha manifestado. Foi um ponto de viragem. Actualmente, é fácil perceber que o meu êxtase pela vida se soltou e ganhou expressão depois de ler este poema. Hoje celebro o universal e a individualidade, a vida e a morte, os dias e as noites sabendo que sou tudo isso.

Como é extenso, escolhi deixar apenas algumas partes, esperando que sejam o suficiente para vos fazer reflectir e ir mais além.

 

Song of Myself

 

I celebrate myself, and sing myself,
And what I assume you shall assume,
For every atom belonging to me as good belongs to you.
 
I loafe and invite my soul,
I lean and loafe at my ease observing a spear of summer grass.
 
My tongue, every atom of my blood, form’d from this soil, this air,
Born here of parents born here from parents the same, and their parents the same,
I, now thirty-seven years old in perfect health begin,
Hoping to cease not till death.
 
(...)
 
Stop this day and night with me and you shall possess the origin of all poems,
You shall possess the good of the earth and sun, (there are millions of suns left,)
You shall no longer take things at second or third hand, nor look through the eyes of the dead, nor feed on the spectres in books,
You shall not look through my eyes either, nor take things from me,
You shall listen to all sides and filter them from your self.
 
(...)
 
They are alive and well somewhere,
The smallest sprout shows there is really no death,
And if ever there was it led forward life, and does not wait at the end to arrest it,
And ceas’d the moment life appear’d.
 
All goes onward and outward, nothing collapses,
And to die is different from what any one supposed, and luckier.
 
(...)
 
I am the poet of the Body and I am the poet of the Soul,
The pleasures of heaven are with me and the pains of hell are with me,
The first I graft and increase upon myself, the latter I translate into a new tongue.
 
I am the poet of the woman the same as the man,
And I say it is as great to be a woman as to be a man,
And I say there is nothing greater than the mother of men.
 
(...)
 
The past and present wilt—I have fill’d them, emptied them,
And proceed to fill my next fold of the future.
 
Listener up there! what have you to confide to me?
Look in my face while I snuff the sidle of evening,
(Talk honestly, no one else hears you, and I stay only a minute longer.)
 
Do I contradict myself?
Very well then I contradict myself,
(I am large, I contain multitudes.)
 
 
Walt Whitman

Voz de adolescente

Sofia
15
Ago20

aqui escrevi que a minha relação com a escrita foi em tempos muito conturbada e que muito do que escrevi no passado desapareceu (foi para o lixo - reciclagem - ou para lareira, quando estava armada em drama queen).

Desses tempos e escritos, restam-me apenas memórias. Ontem, tentei recuperar pequenas coisas que escrevi e que a minha boa memória decidiu reter (acho que as rimas ajudaram, se fosse com os poemas mais recentes não sei se a boa memória bastava). Não sei se fiz bem, porque desenterrei algumas coisas menos boas. Mas recuperei 3 poemas que não me trazem assim tão más recordações e que me permitem ver o meu percurso. Os poemas e pedaços de poemas que trazem recordação menos boas também me permitem ver o meu percurso. Estes casos até me permitem ver melhor o quanto cresci e o quão forte me tornei! Tratam-se de questões muito mais profundas do que a escrita. São questões sobre quem eu sou, sobre o amor-próprio, sobre o amor, sobre o sentido de tudo e o meu lugar no mundo...

É quase certo que o que aqui deixo não estará completamente idêntico ao original desaparecido, mas esta era a Ana Sofia de há mais de 10 anos, a Ana Sofia com cerca de 17/18 anos... Uma sonhadora tristemente inconformada e revoltada com a realidade... Não era tudo mau, mas a minha cabeça era um lugar terrível naqueles tempos. Fui a uma psicóloga, mas não correu bem. Há bons e maus profissionais em todas as áreas e eu não consegui ver naquela psicóloga vontade de me ajudar. Fui lá três vezes e depois fartei-me, porque senti que aquela pessoa só queria saber do dinheiro que a minha mãe pagava... Ainda assim, as três consultas tiveram um efeito positivo. (Se calhar era mesmo assim, uma terapia cognitivo-comportamental de choque, de efeito rápido.) Como tinha decidido procurar ajuda porque sabia que não estava bem e a ajuda que tive apenas me deixou furiosa, percebi que eu teria de ser a minha própria ajuda e que teria de arranjar forças mesmo que parecesse impossível. Também percebi que tinha um amor aos livros maior do que imaginava. Quando a psicóloga me sugeria ler a Bíblia e ir à missa em vez de ler Fernando Pessoa ou Al Berto, na minha cabeça eu mostrava-lhe um manguito mental. (Ainda por cima sugeriu-me isto numa altura em que eu me sentia extremamente indignada com a religião...) Ela não percebia, certamente, mas eu sabia que aquelas palavras eram o meu alento naquela tempestade e que não as podia deixar de parte. Compreendo que, quando estamos mal, é preciso ter cuidado com algumas coisas que podem ajudar a perpetuar esse nosso estado. Contudo, hoje percebo que não era isso que acontecia quando lia O Livro do Desassossego ou O Medo. Foram precisos alguns anos para perceber melhor o que aconteceu e reconciliar-me com alguns livros. Como os descobri na pior fase da minha vida, passei a associá-los àquele período e, durante algum tempo, não lhes quis pegar. Abominei a ideia da psicóloga, mas a minha cabeça fez uma terrível associação que teve de ser desfeita com o tempo. O tempo, como dizem, cura tudo. Não foi só o tempo. Contudo, o tempo foi essencial. Hoje apercebo-me de que aqueles livros me traziam momentos de felicidade no meio do desespero e que foi graças a eles que me aguentei. Senti-me compreendida nas palavras dos outros e percebi que o mundo era um lugar estranho e intenso tanto para mim como para outros. Redescobri também a beleza do mundo e acalmei o meu coração-esponja.

Não vou partilhar as coisas que me lembram mais o que é mau do que o que é bom, mas deixo-vos três poemas que escrevi quando era ainda uma jovem à procura da sua voz. O primeiro é o mais recente dos três, acho eu, e até tenho um certo carinho por ele.

 

Bailarina de Palavras

Sou uma bailarina de palavras 

Eu não danço com os meus pés 

Danço com o meu coração 

Danço com as palavras 

Danço por paixão 

 

A música que me faz dançar 

Não é de Tchaikovsky 

Ou de outro grande compositor 

São as estrelas a brilhar 

São as árvores a abanar 

 

Mas eu e a menina de rosa 

Temos algo em comum 

Ambas dançamos com alma 

Ambas sabemos sonhar 

Elevamo-nos até onde podemos 

Amor em tudo o que fazemos 

 

.................................................................................................

 

Estavam rosas de papel esquecidas no teu estendal. 

Sacudi-as, pois até parecia mal! 

Mas passou uma andorinha e levou consigo 

uma flor que não era minha... 

E se ela te fosse entregar a flor que eu ousei maltratar? 

 

A Primavera passou, mas a andorinha voltou. 

Voltou para te entregar o que eu tentara esconder 

com medo de te perder. 

 

.................................................................................................

 

E eu aqui perdida na rua 

Solto alta a voz que ecoa 

E eu aqui à beira do rio 

Sorrio perdida no meu desvario 

 

A voz que sai do meu peito 

É pequena e já sem proveito 

Mas eu canto com as estrelas do céu 

Que me beijam a face e me cobrem o véu 

 

O altar é longe daqui 

Sinto ardor quando estou a andar 

Cada passo é uma pedra 

Que queima no chão e fere a pegada 

 

Faça a fineza de lhe devolver o coração, Don Juan modernizado 

A menina precisa dele! 

 

Ana Sofia Alves