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a world in a grain of sand

um mundo num grão de areia

a world in a grain of sand

um mundo num grão de areia

...

Sofia
30
Mar25

Quando não estamos fechados entre quatro paredes ou quatro linhas de um ecrã, muita coisa acontece, coisas boas ou más. A vida acontece.

E assim se passam dias, meses, anos.

 

And some things that should not have been forgotten were lost. History became legend. Legend became myth. And for two and a half thousand years, the ring passed out of all knowledge.

J. R. R. Tolkien, The Lord of the Rings: The Fellowship of the Ring

 

Agora vou percebendo melhor aquelas histórias que os mais velhos repetem porque os marcam. Com a velocidade dos anos, percebo ainda melhor o brilho nos olhos ao recordar memórias felizes. Também percebo a aceitação do que de menos bom nos acontecesse e que, todavia, faz de nós aquilo que somos. Percebo os queixumes das nossas maleitas e, no fim, a nossa aceitação com um "graças a Deus, podia ter sido pior". E nem religiosa sou. Mas quem diz "graças a Deus", diz um "valha-nos isso" ou uma outra qualquer expressão de gratidão para com o universo. Vou compreendendo melhor esta sensação de força e de esperança que nos faz seguir em frente, mesmo no meio das adversidades.

Ora, espero num próximo retorno contar sobre a minha viagem mal planeada a Marselha. Já a tinha mencionado no meu último post, mas depois passaram-se mais coisas, porque a vida nunca pára. O meu namorado foi diagnosticado com diabetes. Uma das minhas gatas foi diagnosticada com diabetes. (Não, não andávamos a atacar potes com rebuçados.  Agora já podemos fazer piadas porque as coisas já estão controladas e o humor torna os dias mais leves.) Tivemos uma viagem de sonho a Turim onde pudemos juntar o sonho de conhecer Itália com o de ver o nosso Benfica no estrangeiro. Fica aqui registada a vontade de falar sobre Turim, depois de Marselha.

Fevereiro passou a correr e quando dei por mim, cheguei a Março e espatifei-me - literalmente. Caí na nossa bela calçada portuguesa e rompi o menisco. Vale-me o teletrabalho para não ficar em casa só a olhar para o ar. Não é que me faltem livros para ler e filmes e séries para ver, mas o trabalho, mesmo nos dias menos entusiasmantes, faz-me falta e mantém-me a cabeça ocupada, sobretudo agora que dou comigo farta de tanto repouso por causa do joelho. Passei assim mais um aniversário em casa, desta vez para repousar a perna. Sempre é melhor que estar confinada por causa de um vírus.

Vou ter uma nova consulta esta semana e só espero pelo melhor. Pelo menos, a minha gata Maria já está de volta depois de ter estado internada por causa da diabetes. Felizmente, apesar do internamento, foi por uma boa causa - reduziu a toma de insulina diária. Falaram-nos que pode acontecer os gatos com diabetes entrarem em remissão. Ainda é cedo, mas o mau que nos levou ao veterinário acaba por ter algo de bom.

Brincar ao desassossego

Sofia
03
Jan21

Tenho de desabafar sobre este assunto... Não é bom cantar músicas quando estamos com demasiada energia e alegria dentro de nós... Além de perdermos a noção do volume, há uma grande probabilidade de se trocarem as letras... Por exemplo, ao cantar a "Bellevue" dos GNR, pode sair algo como "era só para brincar ao desassossego" em vez de "era só para brincar ao cinema negro". E vá-se lá perceber a escolha musical que, efectivamente, não combina com o estado da coisa...

( Bernardo Soares likes this post.)

 

P.S.: Peço desculpa se o título vos desiludiu e esperavam algo mais profundo. 

 

A minha vida é como se me batessem com ela.

Bernardo Soares, Livro do Desassossego

Haverá sempre manhãs

Sofia
11
Out20

Haverá manhãs melhores que as manhãs de Domingo? Não sei, mas para mim as manhãs de Domingo sempre tiveram um sabor especial. Talvez por poder dormir mais por não existirem compromissos e, por conseguinte, acordar despreocupada... Talvez por saber que ainda há todo um dia pela frente para descansar e / ou organizar-me... Sempre gostei dos Domingos. Mas eu gosto de muitas coisas. Até das segunda-feiras consigo gostar. Talvez por serem um recomeço e eu sentir que a minha vida e a de todos é um eterno recomeço, que o mundo é feito de recomeços, que tudo vai e vem, porque é assim que as coisas são.
Ao longo do tempo, essa coisa que é, por vezes, difícil de definir e perceber, aprendi a ver o lado bom das coisas menos boas ou a ver outras coisas. Não me considero propriamente optimista. Como é que o poderia ser? Acordo de manhã e sei que tanto pode correr tudo bem como pode ser um dia terrível, mesmo que eu faça tudo pelo melhor. Ainda que o meu dia seja aparentemente perfeito, esse dia não é só meu. No mesmo dia, outros podem estar na parte de baixo da roda. Posso deixar-me contagiar pela ideia de que o dia é fantástico ou pela ideia de que o dia é terrível. Prefiro uma espécie de neutralidade com pinceladas de coisas boas e pinceladas de coisas más. Talvez o segredo seja cultivar o nosso jardim como nos diz Voltaire1.
Observo, penso e transformo. As crenças são complicadas para mim. Tenho valores basilares na minha vida e que, certamente, influenciam a minha maneira de agir, mas não me afundo em crenças várias, fico sempre à superfície, porque aquilo que parece límpido pode revelar-se um autêntico engodo, porque tudo é grande e mais complexo do que parece e o que nos parece estar certo pode afinal estar errado. Mais, há situações em que é difícil perceber o que é certo e o que é errado. Acredito em meia dúzia de coisas amorfas que me parecem universais. Gosto de pensar que existem coisas que são comuns a tudo. Gosto das palavras de Whitman ("For every atom belonging to me as good belongs to you")e talvez uma das minhas poucas crenças seja a de que fazemos todos parte de algo.
A manhã de Domingo chega ao fim, mas sei que haverá mais manhãs e mais Domingos, porque o Sol nasce e põe-se marcando o nosso passo.

 

1 - Voltaire. Cândido, ou O Optimismo

2 - Whitman, Walt. "Song of Myself". Leaves of Grass