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a world in a grain of sand

um mundo num grão de areia

a world in a grain of sand

um mundo num grão de areia

Da minha estante para o mundo #2

Sofia
27
Jul20

Se houvesse um homem que se atrevesse a traduzir o que lhe vai no coração, escrever a sua verdadeira experiência, o que é verdadeiramente a sua verdade, acredito que o mundo se desfaria, se partiria em mil pedaços e não haveria deus, acidente, ou vontade que conseguissem voltar a juntar os pedaços, os átomos, os elementos indestrutíveis com que se formou o mundo.

Henry Miller in Trópico de Câncer

Da minha estante para o mundo #1

Sofia
22
Jul20

Na minha sala há duas estantes com livros e uma outra estante que, servindo para várias coisas, abriga também alguns livros. Isto não é nada comparado com a casa da minha mãe cuja sala me fazia lembrar uma pequena biblioteca quando eu era ainda uma criança. Gostava de ter mais livros, mas este pequeno prazer implica gastar dinheiro e ter espaço. Como nunca li todos os livros da minha "biblioteca" de infância, quando vou a casa da minha mãe, aproveito para trazer alguns livros emprestados. (Ficaram tantos por ler!) Volta e meia cedo às tentações e compro mais um livro para a minha estante. Embora goste muito de ler no papel, não sou puritana, por isso tenho pensado em investir num leitor de livros. A minha casa agradece a ideia.

Nas minhas estantes, há livros que me chamam frequentemente - os livros de poesia. Às vezes sinto uma enorme necessidade de pegar num desses livros e ler algumas palavras. Naquelas páginas, naquelas palavras, o mundo faz sentido, mesmo que o céu esteja a cair.

Hoje partilho um pedaço de um pedaço da minha estante, um poema sobre a escrita.

 

A Criação
 
Acontece deste modo: uma certa languidez;
No ouvido não se calam as pancadas dos relógios;
Ao longe diminui o estrondo do trovão.
E vislumbram-se queixas e gemidos
De aprisionadas vozes que não se reconhecem.
Um certo círculo secreto estreita-se,
Mas nesse abismo de badaladas e murmúrios
Levanta-se um som que tudo venceu.
É tal o silêncio irreparável em seu redor
Que se escuta como no bosque cresce a erva,
Como anda pela terra o mal com um alforge...
Mas as palavras começaram já a ouvir-se
E das rimas leves os tinidos da sinalização, –
É quando eu começo a compreender,
E de modo simples as linhas ditadas
Deitam-se no caderno branco de neve.
 
Anna Akhmatova